No seu primeiro discurso no parlamento, Nuno Crato fez referência à necessária igualdade de oportunidades dos alunos, no acesso à educação, independentemente das condições sociais e financeiras das suas origens.
Acho que fica muito bem esta referência. Aliás, é um pensamento partilhado por qualquer pessoa de bem.
No entanto, e porque há sempre um “entanto”, ficaria muito melhor a Nuno Crato (e a muita gente) saber que essa igualdade de oportunidades não existe, nem vai existir. Não é uma questão de pessimismo crónico. É, tão só e apenas, uma constatação muito simples: tanto quem aconselha, como quem decide, em matéria de educação (ah… os especialistas, esses virtuosos…), presume que a escola consegue resolver esse problema.
A questão da falta de igualdade de oportunidades, em Portugal, ainda não se pode resolver dentro da escola. E é muito fácil perceber porquê. Basta pegar em dois jovens, de condições financeiras iguais e condições sociais diferentes. Dois jovens normalíssimos, a entrarem para o 7º ano. O jovem A, de pais bardinas (com o 6º ano de escolaridade) e que se estão “nas tintas” para que o filho estude ou deixe de estudar. E o jovem B, de pais atinados (com o 6º ano de escolaridade) e que desejam que o filho prossiga estudos e seja alguém na vida.
Por serem jovens normalíssimos, aos 12 anos, o que apetece mesmo é vadiar, brincar, jogar à bola e pregar umas partidas. Estudar, não faz parte das actividades preferidas.
Onde é que a desigualdade de oportunidades se evidencia, sendo a escola impotente para resolver o problema?
O jovem A, que deseja fazer só o que lhe apetece, tem margem de manobra para isso e para muito mais, como se fosse um “órfão de pais vivos”. Em menos de nada, a escola é apenas um local para passar parte do dia, a fazer o que lhe apetece, embora tenha que passar algumas horas dentro de quatro paredes (a fazer o que lhe apeteça). Em casa, nem vale a pena haver uma mesa para estudar, porque não é preciso. Acumulam-se as negativas e as queixas dos professores, perante a indiferença dos pais.
O jovem B, também deseja fazer só o que lhe apetece, mas não tem margem de manobra para isso, porque os pais controlam-no diariamente. Acompanham o percurso escolar, vão à escola, falam com o director de turma, perguntam pelo comportamento nas aulas, verificam e assinam os testes, exigem do filho um desempenho dentro das suas capacidades, obrigam-no a estudar e cuidam de que tenha condições em casa para o fazer. Os resultados escolares positivos são o melhor prémio para o esforço dos pais.
Porque os iluminados dos gabinetes assim decidiram, a escola oferece ao jovem A vários tipos de apoios: acompanhamento individualizado dentro da sala de aula, “explicações” gratuitas a algumas disciplinas, um tutor só para ele, e outras coisas do género. Mas o mocinho, que não é parvo e já percebeu que pode fazer apenas o que lhe apetece, “borrifa-se” para os apoios todos. Tem mais que fazer. Os professores, feitos tolinhos, passam os dias atrás dele, para o arrastarem para dentro de uma sala para mais uma sessão de apoio. No final do ano, foi um ano porreiro: oito negativas e algumas participações disciplinares, como se fossem medalhas que exibirá orgulhosamente perante os amigos. Com jeitinho, e não precisa de ser muito, o Conselho Pedagógico acabará por ditar a sua transição, porque ah e tal a idade e mais qualquer coisinha.
Em resumo, só começará a haver igualdade de oportunidades no acesso à educação em Portugal, quando o Estado intervir – com pulso de ferro – na educação que os pais dão aos filhos. Mas, para se começar sequer a caminhar nesse sentido, é preciso que muita gente perceba quão impotente é a escola – e esta é a parte mais difícil.
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