Terça-feira, 29 de Setembro de 2009

Quem votou em Sócrates?

Ainda estou com dificuldades de digestão, depois de ter engolido os resultados das eleições legislativas. Talvez me fique mal, do ponto de vista do “espírito democrático”, este tipo de comentário, mas, pela parte que toca à educação, Sócrates concretizou dois tipos de disparates:
 
1. Um ataque à classe docente, não tanto pelas questões corporativistas de que os defensores desse senhor tanto falam, mas pela forma como sacudiu, do capote dos políticos para os ombros dos professores, as culpas pelo estado da Educação, e pela quantidade de palermices sem sentido que assistiram à mudança do Estatuto da Carreira Docente e, consequentemente, da forma de avaliar o desempenho dos professores.
 
2. Uma facada profunda no serviço prestado pela Escola Pública à nação portuguesa, que a esmagadora maioria do povo não consegue vislumbrar, que inclui um claro incentivo ao lazer com a oferta de computadores a troco de nada, um regime de faltas dos alunos com o claro intuito de fazer brilhar as estatísticas do abandono, um inclinar acentuado do navio para os CEFs e PCAs – que “qualificam” muito mais do que formam -, e mais meia dúzia de trocos cuja visibilidade é ainda menor.
 
Há uma diferença gigantesca entre uma opção política e um disparate!
 
As opções políticas, tomam-se depois de muita ponderação e, quando necessário, depois de alguns testes. Implementam-se cuidadosamente, com coerência, com rigor, bem explicadas a todos os intervenientes, e, mesmo que haja discordâncias, reconhece-se-lhes algum sentido.
 
Os disparates… Bom! Os disparates acontecem quando se criam coisas mal feitas, não testadas, incoerentes, mal explicadas, disfuncionais e sem sentido.
 
Foram os disparates que colocaram 120 000 professores nas ruas, que originaram greves com uma adesão tão grande e que provocaram esta onda tão grande (nunca vista?) de contestação generalizada da classe docente. Ao contrário das desculpas esfarrapadas dos apoiantes de Sócrates, culpando o corporativismo, os sindicatos e o oportunismo da oposição. Corporativismo é coisa que nunca tivemos, tal é a falta de união da nossa classe; os sindicatos nunca na vida conseguiriam movimentar, por sua obra e graça, tanta gente; e o oportunismo da oposição, francamente, nunca conseguiu mexer mais que duas ou três palhas no palheiro inteiro.
 
Posto isto, uma fatia grande dos votantes acha que os disparates de Sócrates foram coisas bonitas de se ver e que assim o país vai longe. Senti alguma curiosidade em tentar perceber quem teria votado em Sócrates, evidenciando, assim, uma clara preferência pela continuidade dos disparates. A área da Educação, por ser a única que domino e sobre a qual me posso pronunciar com conhecimento de causa, é quanto basta para vislumbrar algumas respostas.
 
Quem votou em Sócrates?
 
1. Alguns Professores Titulares, que “treparam” administrativamente ao “coqueiro” da divisão superior da carreira, que tremem só de pensar que alguma vez o processo poderá ser invertido e assim voltariam à estaca zero, acabando-se-lhes a vantagem salarial quase eterna. Em especial alguns professores titulares de qualidade duvidosa, que sabem muito bem que de outra forma qualquer com algum pé de racionalidade nunca passariam “à frente” de colegas mais competentes.
 
2. Alguns pais e mães ansiosos pela dádiva de um Magalhães ao rebento que agora entrou no 1º ano, ou aos que entrarão nos anos seguintes. O peso do Magalhães a hora de votar é tanto que até houve oposição a garantir que também dava Magalhães ao povo.
 
3. Alguns pais e mães ansiosos pelos portáteis do programa e-escola, ou simples adultos em condições de obterem um, receosos que outro partido político pudesse acabar com o regabofe do programa.
 
4. Alguns adultos com todo o tipo de habilitações, desde sopeiras até professoras, que acham o máximo ter um primeiro-ministro que foi eleito o sexto homem mais elegante do mundo, ainda por cima tão bem falante.
 
5. Alguns singelos Professores, ansiosos por prestarem a Prova Pública e passarem a Titulares na próxima fornada de vagas que o magnânime Ministério da Educação se lembrar de criar num futuro muito próximo, deixando para trás – em matéria de remuneração – os restantes colegas que não puderam concorrer ou que se armaram em “tansos” e não quiseram concorrer.
 
6. Muitos ressabiados do povo, que andaram a bradar aos céus, durante toda a campanha, que depois de Sócrates ganhar as eleições a terrível vingança se iria abater sobre a escumalha dos professores, sendo que, tal como alguns afirmaram, “em qualquer país evoluído os professores são uns insignificantes e fazem parte da ralé”.
 
7. Muitos professores militantes do Partido Socialista, que, naquele momento íntimo e secreto do voto, sem ninguém a espreitar por cima do ombro que pudesse abanar a cabeça em sinal de reprovação, votam no seu partido do costume, porque é o partido do costume, mas, também, porque isso pode condicionar a forma como o povo irá votar nas eleições autárquicas, em cujas listas socialistas muitos deles participam.
 
8. Os beneficiários directos de medidas como aqueles subsídios que o Estado oferece, de mão beijada e sem requerer nada em troca, a quem não quer trabalhar, a quem passa o dia no café à espera que os trabalhadores regressem para poder gozar com eles.
publicado por pedro-na-escola às 22:51
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